quinta-feira, 24 de maio de 2012

Chelsea x Barcelona e Chelsea x Bayern de Munique: semelhanças e diferenças


Já que na semana passada todos os olhares foram voltados para o jogo entre Bayern de Munique e Chelsea, nesta semana vou focar em análises sobre os últimos jogos da equipe campeã. Decidi escrever um pouco das semelhanças e diferenças entre as partidas “Chelsea x Barcelona” e “Chelsea x Bayern”.

Ao observar novamente os dois jogos, percebi que existiram diversas semelhanças táticas nas duas partidas, mas ao mesmo tempo, algumas diferenças que ao meu ver foram pontuais para traçar o perfil das três equipes.

Ao discorrer a análise das três equipes concomitantemente notei que a atmosfera em volta de cada uma era completamente diferente. Todas as três tinham um tipo de pressão a carregar nas costas. Primeiro, o Barcelona que tinha uma responsabilidade de valor mundial. Isso significa que não era a pressão de ganhar consecutivamente outra Champions League ou dar resposta a uma torcida ou país, mas sim conseguir cravar ao mundo do futebol um modelo brilhante de jogo. Já o Bayern de Munique, tinha uma responsabilidade muito mais caseira e nacional, isto é, conseguir ganhar uma competição europeia dentro de casa, juntamente com a sua torcida. Por último, o Chelsea tinha uma responsabilidade mais clubista, sendo que o time inglês ainda devia uma resposta ao grande investimento recebido durante os anos antecedentes.

As duas partidas foram muito parecidas taticamente. Para começar, Barcelona e Bayern tiveram um percentual de posse de bola muito maior que o Chelsea durante os 90minutos de jogo. Nos 30 minutos de prorrogação entre Chelsea e Bayern, o clube inglês conseguiu diminuir a diferença (55% para o Bayern e 45% para o Chelsea). Coincidentemente, mais uma semelhança: os pênaltis perdidos pelas estrelas das duas equipes. 

Em relação às movimentações dentro de campo, pude observar que no jogo contra o Barcelona, o clube londrino entrou em campo já com uma estrutura tática totalmente estudada e treinada disciplinadamente por seus jogadores. Tanto em Stamford Bridge quanto no Camp Nou, o Chelsea entrou com uma formação extremamente defensiva, jogando com uma linha de cinco jogadores: os dois zagueiros; os dois laterais e o Obi Mikel mais avançado. Contava com mais uma linha de quatro jogadores um pouco mais a frente: dois jogadores de meio-campo; Kalou na ponta direita e Drogba na ponta esquerda. Apenas Juan Mata flutuava de forma mais livre durante toda a partida e mesmo assim ainda na metade do campo do Chelsea. O que mais me impressionou nessa marcação foi que nos dois jogos, a equipe se portou da mesma forma. Na parte ofensiva, a equipe demonstrou um contra-ataque bem eficiente com Lampard, Ramires e Drogba. E, novamente, perfil ofensivo bem parecido nos dois jogos. 

No jogo contra o Bayern, o Chelsea mais uma vez mostrou uma disciplina tática eficiente, mas com algumas diferenças dos jogos contra o Barcelona. Primeiro, o clube inglês entrou em campo com duas linhas de quatro jogadores na defesa mais espaçadas uma das outras do que em relação às duas linhas utilizadas contra o Barcelona. Outra mudança foi o avanço do Mikel para a segunda linha e do Drogba como jogador flutuante juntamente com o Mata. Na parte ofensiva, o Chelsea não conseguiu realizar avanços em contra-ataque efetivos como os do jogo contra o Barcelona. Fato observado justamente pela falta da válvula de escape em velocidade do primeiro jogo: Ramires. Observou-se, desta forma, ataques inoperantes de chutes diretos da intermediária em busca de um único jogador: Drogba. Insucesso absoluto. Esta situação ocorreu até os 40 minutos do segundo tempo.

O Barcelona, assustadoramente mais envolvente na partida, se deparou com uma estrutura tática muito disciplinada. Guardiola e seus pupilos jamais tinham jogado contra um esquema desses. Os espaços para atacar eram pequenos. O clube catalão entrou com sua tradicional linha defensiva próxima ao meio de campo sem jogador na sobra, fazendo a linha de impedimento. Contava ainda com sua usual linha ofensiva de 5 jogadores no ataque e com Busquets mais recuado, além da flutuação de Daniel Alves como auxiliar ao ataque, principalmente em jogadas aéreas. Porém, aí foi onde o clube sentiu dificuldade: a jogada aérea. Contra o Chelsea, essa arma do clube espanhol foi inoperante, devido, em primeiro lugar, à grande quantidade de defensores cobrindo os espaços dentro de toda a demarcação da grande área, além da falta de adaptação dos jogadores do Barça com esses tipos de jogadas. Os jogadores baixos não conseguiam encontrar espaços nem depois da entrada de Keita.

Outro ponto decisivo para acarretar dificuldade ao ataque espanhol foi a ineficiência em chutes de fora da área. Mesmo com a total posse de bola, os jogadores não arriscavam e nem criavam formas para o arremate. Observei também a insistência dos jogadores espanhóis ao entrar com troca de passes dentro da área a todo o momento, como de costume. Entretanto, o resultado negativo não trouxe uma mudança de postura da equipe, pelo contrário. A insegurança em utilizar outro tipo de estratégia fez com que os jogadores perdessem a paciência e errassem mais passes. 

Já ouvi um jargão mais ou menos assim: “Se o inimigo só estiver defendendo, abra suas portas e deixe-o atacar para poder surpreendê-lo”. Em nenhum momento o Barcelona recuou sua marcação para tentar surpreender o Chelsea. Não será que o erro mais mortal é achar que somos imortais?

Para finalizar, houve um visível abatimento de todo o time após o pênalti perdido por Messi. Os minutos posteriores à infração foram os que tiveram maior quantidade de erros de recepção e passe por parte dos jogadores do Barcelona.

Em relação ao Bayern, já na metade do primeiro tempo eu cravei: “Bayern vai ganhar facilmente”! Todos os pontos que trouxeram dificuldade ao Barcelona estavam sendo supridos pelo clube alemão. Nas jogadas aéreas, a equipe tinha a presença de Mario Gomes e Muller para preocupar os zagueiros e abrir espaços dentro da grande área. A equipe alemã ainda contava com os pontas Ribery e Robben que forçavam cruzamentos constantemente. Em relação aos arremates de fora da área, os mesmos pontas juntamente com Schweinsteiger arriscavam diversas vezes e demonstravam perigo ao goleiro Peter Cech. Os contra-ataques do Chelsea eram ineficientes. Nas bolas chutadas para Drogba, a zaga tirava facilmente. Foram observados raros tiros de canto a favor da equipe inglesa. Na defesa, as linhas mais espaçadas do Chelsea proporcionaram uma entrada do ataque do clube alemão com maior facilidade. Portanto, tudo apontava para o gol da equipe do Bayern.

O gol de cabeça de Muller saiu depois de uma conquista de espaço por Mario Gomes ao utilizar seu corpo. Realmente pela bola parada e com a altura e costume dos jogadores, a equipe alemã conseguiu um espaço que o Barcelona não tinha capacidade de achar. Até o gol, tudo parecia inofensivo para a equipe do Bayern. Tudo mudou quando o técnico Jupp Heynckes sacou o Muller e colocou o zagueiro central Van Buyten logo após o gol. Diga-se de passagem, sem nenhuma necessidade. Não vi sentido algum na entrada do zagueiro belga, não por criticar o futebol dele, mas por mudar drasticamente a postura da equipe.  A equipe alemã que tinha sua linha de frente bem composta e que marcava com Ribery, Robben e Muller a saída de bola do Chelsea, se recuou lamentavelmente. Qual seria o sentido de colocar mais um zagueiro na equipe, já que o time não vinha sofrendo ataques de bola aérea e nem jogadas ofensivas de desigualdade numérica na linha mais defensiva?! Logo após a entrada do zagueiro, o time inglês deixou um espaço maior para o Chelsea entrar na segunda linha defensiva e a pressão acarretou em um escanteio. Justamente na jogada aérea, ponto em que o clube alemão teria que estar mais forte pela entrada de mais um zagueiro, a equipe sofreu o gol.

Não justifico a derrota do Bayern devido à entrada de Van Buyten, mas a configuração ofensiva do time alemão mudou tanto depois da modificação, que a posse de bola das duas equipes se equilibrou na prorrogação. Não foi o fato de perder o Muller que acarretou a mudança, mas também por observar o zagueiro Tymoshchuk se tornando o responsável por armar as jogadas da linha defensiva ao invés do Kroos que estava realizando esta função nos 90 minutos. Além disso, o próprio Kross teve que sair da sua posição de origem e se colocar na linha de frente exercendo a função do Muller. A grande quantidade de erros de passe ocorreu justamente por esses jogadores. Aliás, como estou falando de semelhanças e diferenças entre os times, esse seria o tipo de mudança que o treinador do Barcelona dificilmente realizaria, pelo fato de ter demonstrado e escrito várias vezes que o hábito de se colocar zagueiro quando o time está ganhando ocasiona uma pressão ofensiva ainda maior para equipe adversária. É lógico isso, já que a linha de marcação do meio de campo será reduzida e os ataques mais pertos da grande área serão mais constantes. É a chamada geometria do futebol.

Para finalizar, mais uma semelhança com o Barça: o pênalti perdido. Desta vez, o protagonista foi o craque Robben. E, novamente, a cena de abatimento total da equipe alemã foi observada.

Sei que pode ter sido certo ou errado, bonito ou feio e chato ou legal, mas só teve um campeão: o Chelsea. As análises descritas podem ou não servir como justificativas das vitórias ou das derrotas das equipes. Sempre ouvi do meu avô João a frase: “Os vencedores comemoram e os perdedores justificam”! Assim sendo, nada mais justo de tentar justificar tanto uma vitória quanto uma derrota dentro desse esporte injustificável.

domingo, 20 de maio de 2012

Chelsea campeão da Europa: mais uma confusão para a tendência do futebol mundial


Mais uma Champions League chegou ao fim neste sábado, dia 19 de maio de 2012, com a disputa entre Bayer de Munique e Chelsea. Todas as atenções do futebol se voltaram para essa partida. Duas equipes com perfis e composição tática completamente diferentes, mas com um único objetivo: ser o melhor time da Europa. Chelsea foi consagrado o campeão. 

Não posso negar minha tristeza em relação ao resultado final. Digo isso não por desgostar do Chelsea ou torcer pelo Bayer de Munique ou qualquer outro time que o clube inglês enfrentou. A lamentação da vitória é justificada pelo estilo de futebol apresentado pelo clube londrino que me preocupa, sobretudo por recapitular um pouco da tendência do futebol mundial iniciada em 1966 e que permaneceu até 1998. O futebol caracterizado pelo foco na defesa, robustez e composição física que buscou conhecimentos do treinamento esportivo das escolas soviéticas, britânicas e alemãs daquela época e que foge completamente da nova filosofia que está encantando os amantes do futebol em todo o mundo.

Os treinamentos voltados ao atletismo foram catda vez mais aplicados ao futebol e virou prioridade em detrimento à técnica a parir do momento em que o esporte observou a final entre Inglaterra e Alemanha Ocidental na Copa do Mundo de 1966. As duas seleções que cultivaram a ideia do treinamento físico das escolas europeias sobressaíram em relação às individualidades das seleções cotadas como campeãs, como o Brasil, que na época era a detentora da taça, Argentina e Portugal. 

A moda depois daquela final se tornou o futebol-defensivo, o futebol-físico, o futebol-pé-na-bola. O futebol-arte e o futebol-bola-no-pé não conseguia mais seu espaço, mesmo depois da vitória do Brasil em 1970 e da filosofia do “Futebol Total” empregada pelo holandês Rinus Michels em 1974 com o famoso “Carrossel Holandês”. A derrota da Holanda naquele ano para a Alemanha cravou mais uma vez o físico e a defesa em primeiro lugar, infelizmente. Foram anos e anos com o futebol voltado para esta filosofia. Até o Brasil adotou a nova tendência em 1994. O futebol estava diferente, menos técnico, mais físico, mais feio, mesmo assim a individualidade ainda fazia diferença no mundo, em um momento em que a Europa estava dando seus primeiros passos para o estudo do futebol aplicado ao jogo propriamente dito. 

Os anos de glória do futebol pé na bola se fixaram com soberania até a Copa de 1998, onde o mundo inteiro presenciou uma das Copas mais belas da história. As seleções encantavam mais uma vez com o futebol bonito e envolvente. Além das presenças de seleções que, tradicionalmente, apostavam no futebol técnico como a Holanda de Overmars, Kluivert e Bergkamp e a Argentina de Batistuta, Gallardo e Veron, os loucos por futebol tiveram o luxo de presenciar seleções nacionais mostrando uma cultura de futebol inovadora. Primeiro, o surgimento de um país africano que pela primeira vez empregou uma competitividade surpreendente em uma copa do mundo, a Nigéria, que liderou o grupo e deixou para trás a tradicional Espanha. Segundo, vieram os países europeus que se surpreenderam com um futebol mais técnico como a Romênia, Dinamarca, Noruega e a Croácia de Suker. Até países com um futebol tradicionalmente marcado pela defesa e aplicação física e tática dentro de jogo, obtiveram um futebol mais entusiástico como a Alemanha de Klinsmann e Bierhoff, campeã da Euro de 1996, a Inglaterra de Owen e Shearer e a Itália de Vieri e Baggio. Por último, o mundo presenciou uma final de duas equipes que ressurgiram o futebol arte durante a competição. O Brasil de Ronaldo, Rivaldo e Bebeto e a França de Zidane, Thuram e Djorkaeff que fizeram o mundo repensar em uma nova tendência de se jogar futebol.
 
Não se falava mais em futebol físico, defensivo e analítico. A Europa, após 1998, não queria mais focar nos circuitos físicos do treinamento esportivo, fisiologia do exercício e preparação física moderna. O futebol ganhou um olhar mais voltado para a técnica e para situações do jogo. O ideal de treinamento sistêmico ganhou mais espaço. Os países começaram a se interessar mais sobre as aplicações técnicas e táticas dentro do esporte ao invés do jogo físico e sem a posse de bola. As ideias do “Futebol Total” de Rinus Michaels que também foram ressurgidas por Johan Cruijff no Barcelona em 1990 começaram a ganhar força depois de 1998. Além dos resultados positivos do futebol-arte naquela época, o mundo futebolístico presenciava um momento cada vez mais mercadológico. As contratações astronômicas no Real Madrid e Barcelona trouxeram ao mundo do futebol um novo desejo: criar o time e a seleção dos sonhos.

Os países europeus tentaram se moldar à nova tendência, mas mudar uma cultura de se jogar futebol demanda um trabalho a longo prazo e alguns precisavam de mais provas para ver se aquilo valeria a pena. A prova saiu em 2002, com o Brasil campeão, mesmo com um time menos técnico que o de 1998. Entretanto, o que mais chamou a atenção foi a drástica mudança da vice-campeã mundial, a Alemanha. Na Ásia, a seleção europeia mostrou um futebol diferente do habitual presenciado por sua torcida. Apostou no jogo de posse de bola e foi aplaudida na chegada em casa mesmo com a derrota para o Brasil.

O futebol precisaria realmente mudar. A moda novamente tinha se tornado o Brasil. Um país que encantou o esporte pelas individualidades seria novamente o modelo do futebol mundial. Várias seleções tentaram inovar para 2006. A visão sempre era em cima do Brasil. Os jogadores brasileiros eram os mais procurados e valorizados em todo o mundo. O Brasil era realmente o país do futebol. Até quando ocorreu o desastre em 2006.

Nem os mais pessimistas esperavam o resultado desastroso da copa. O mundo viu a queda das equipes que tentaram empregar um futebol para frente, como foi o caso da Inglaterra, Holanda, Espanha, Argentina e, principalmente, o Brasil. Mesmo com a Alemanha com um futebol ainda mais técnico ficando em terceiro lugar, a final foi entre a França e a Itália. Duas equipes que não precisaram de um futebol envolvente para conquistar o mundo. O Brasil de Ronaldo, Adriano, Ronaldinho e Kaká não encantou e a Copa foi marcada por uma cabeçada e um zagueiro sendo o melhor do mundo.

Surgiram novamente as desconfianças. Voltaram-se os ideais de futebol-resultado ao invés de futebol-desempenho. As equipes da Europa mais uma vez apostaram no futebol-tradição, conforme a Itália apresentou em 2002. Até Brasil e Argentina se moldaram ao estilo de jogo defensivo para 2010.

Felizmente, na Copa de 2010, a tendência do jogo-pé-na-bola cai novamente diante das filosofias de jogo da Alemanha, Holanda e, principalmente da Espanha. Os resultados apresentados pela seleção espanhola na Euro 2008 e na Copa do Mundo em 2010 fizeram com que o mundo entrasse na era sistêmica e de estudo do futebol. Juntamente com o momento espanhol, o mundo atualmente convive com o fenômeno Barcelona e pelas respostas dadas por José Mourinho e Josep Guardiola. Os dois revolucionaram o treinamento do futebol com teorias e práticas efetivas. Hoje, o mundo futebolístico convive com a tendência do futebol estudado e tático. 

O Chelsea mostrou ontem, mesmo não seguindo os passos do “Futebol Total” ou do futebol técnico, que o mundo precisa cada vez mais ter um futebol tático por meio de muito estudo. Mais uma vez, volto a dizer que não me senti feliz ao ver o clube inglês ganhar, já que ele recapitulou uma forma de se jogar que não me agrada. Todavia, se enganam aqueles que acham que o futebol do Chelsea é o mesmo do futebol físico e defensivo da tendência mundial antiga. A disciplina tática mostrada ao mundo ontem é mais um reflexo da evolução do futebol mundial. Tenho certeza que a tendência que nasce depois de 2010 não mudou e ainda vai demorar para mudar. Talvez essa vitória do Chelsea seja mais um incentivo para o futebol-bola-no-pé encantar ainda mais. Justamente porque alguém descobriu um ponto fraco no meio de tantas qualidades.

Enquanto isso, o Brasil vai andando a passos lentos sem uma filosofia e cultura de jogo. As individualidades estão acabando e as outras nações já se deram conta que o país não é um modelo e muito menos criará um. Sem estudo e implementação sistêmica do jogo, o Brasil não vai conseguir tão cedo ser o país do futebol novamente. Ainda bem que antes de surgir as escolas europeias de treinamento esportivo, nasceram Garrincha e Pelé. Ainda bem que antes de surgir os estudos e aplicações do futebol sistêmico, nasceram Romário e Ronaldo. Quem nascerá agora para ganhar de um futebol tão evoluído como o da Europa atualmente, já que o Brasil não consegue acompanhar seus passos? Kaká, Ronaldinho e Robinho não aguentaram essa injusta pressão. Coitado do Neymar...

quarta-feira, 16 de maio de 2012

A volta dos que já foram: Análise crítica do conceito de preleção no futebol brasileiro e europeu


Atualmente, o futebol brasileiro se encontra em um momento muito diferente do que era decorrente há 6, 7 e 8 anos atrás. Os clubes do futebol nacional, a cada ano que passa, conseguem “repatriar” um enorme número de jogadores que fizeram e ainda têm condições de fazer sucesso nos clubes da Europa e com a camisa de seleções nacionais. Ronaldinho Gaúcho, Deco, Fred, Elano, Liedson, Renato, Juninho, Vagner Love, Gilberto Silva e Adriano são alguns nomes dessa vasta lista. Os motivos para o retorno são os mais diversos. 

Muitos especialistas associam o “repatriamento” à recente crise econômica que a Europa enfrentou e que alguns países ainda enfrentam. Isso pode mostrar a volta de vários jogadores ainda jovens, mas que não foram efetivos em relação custo-benefício na avaliação dos clubes europeus. Os dirigentes dos clubes brasileiros enfatizam a evolução da gestão e do poder mercadológico do futebol brasileiro para realização de contratações consideradas, anos atrás, como impossíveis. Já os jogadores, levam os motivos mais para o lado pessoal, alegando falta de adaptação com o ambiente fora do país ou do estado onde sempre viveram. Muitos ainda voltam falando do amor pela camisa do clube de coração.

Motivos à parte, a ideia deste texto não é falar o que realmente acarreta a volta desses jogadores ou coisa parecida, mas sim, analisar como que esses jogadores estão voltando e desta forma chegar ao tema da postagem de hoje: a preleção.

Independentemente das opiniões diversas sobre o desempenho desses jogadores, é inevitável afirmar que a volta da maioria deles é marcada por um perfil cada vez mais de liderança tanto dentro do ambiente do clube, quanto dentro de campo. Os jogadores que fazem parte da tal lista são os mais procurados pela imprensa, costumam ser os capitães das equipes em que jogam, são os mais cobrados dentro de campo e ainda conseguem encantar nas partidas. 

São várias as perguntas que aparecem acerca dessa reflexão: As revelações já não conseguem mais suprir as necessidades do alto nível em que o futebol nacional se encontra? Os treinamentos dos times europeus são bem melhores do que os nossos?  As categorias de base não conseguem mais revelar jogadores como antes? Os clubes brasileiros preferem apostar em jogadores que possam dar resultado em curto prazo do que investir em projetos de categorias de base em longo prazo? São apenas coincidências na maneira de jogar dos jogadores? Ou é só um momento do futebol brasileiro e isso é passageiro?

A minha ideia não é responder nenhuma das questões acima, ainda mais porque são perguntas rotineiramente comentadas no mundo futebolístico. Acreditando que nunca um momento dentro do futebol se justifica por uma única razão, vou analisar a relação da preleção como fator diferencial entre o futebol brasileiro e o futebol europeu.

Certo dia, no intervalo do treinamento que realizei para trabalhar nos Estados Unidos como treinador, eu estava conversando com dois treinadores que são meus amigos sobre diversos assuntos do futebol, já que os dois também são apaixonados pelo esporte. O assunto “Neymar” surgiu no ambiente. Não sei se fui eu, o Vitor Neves ou o Paulo Sivieri que fez a pergunta, mas sei que o questionamento era o seguinte: “o Neymar deve sair ou não do Brasil antes da Copa”? A minha resposta foi sim, já que lá fora ele iria estudar muito mais sobre o futebol. Na verdade, a resposta poderia até ser: “Sim, porque lá fora ele iria ter verdadeiras preleções”. 

A preleção é um termo muito utilizado no futebol e faz parte do dia-a-dia de praticamente todas as equipes. De acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra preleção significa: “palestra com finalidade didática ou educativa; aula, lição”. A palavra prelecionar significa: “fazer preleções; dar preleção ou lição; lecionar; ensinar; discursar em público”. 

O que todas essas definições nos mostram? Significa que a preleção é um ambiente de aprendizado onde são observadas lições, aulas, ensinamentos e onde é respeitado um espaço para discussões. No futebol não pode ser diferente. A preleção não pode ser confundida com palestra de motivação antes do jogo. Não que eu seja contra isso, muito pelo contrário, mas a preleção é muito mais que estímulos minutos antes do jogo. Não se pode pensar em preleção apenas no dia do jogo. Os ensinamentos devem ser dados diariamente nos treinamentos. O grande problema é que os clubes de futebol brasileiro ainda não conseguem utilizar meios didáticos para fazer com que os jogadores entendam mais sobre o futebol e suas dimensões dentro do campo.

Visivelmente, podemos observar a diferença na leitura e entendimento de jogo dos jogadores que foram para a Europa e voltaram para jogar em clubes brasileiros. É comum observarmos jogadores como o Renato, Deco, Elano e Juninho jogarem como meias armadores, mesmo não sendo suas posições de origem. A inteligência dentro de campo desses jogadores supera a capacidade física dos demais jogadores do futebol nacional. Peço licença para escrever uma frase que meu amigo Paulo Sivieri sempre fala: “Até o Sergio Busquets do Barcelona seria camisa 10 no Brasil”. Será que eu estou sendo muito sonhador mais uma vez? O futebol brasileiro ainda deve continuar com treinamentos diários dentro de campo, visando principalmente a parte física? É errado tirar os jogadores do campo de jogo e levar para uma sala de vídeo e mostrar situações táticas dos adversários? Como se constrói uma filosofia de jogo só pela prática? 

Para finalizar, acredito que o futebol mundial segue tendências. Realmente, o Brasil ainda não entrou na tendência dos grandes times europeus em ensinar o futebol para os jogadores. Talvez um dia, possamos ver jogadores brasileiros saindo no dia de folga da concentração para ver o seu futuro adversário jogar, como os principais jogadores do Barcelona fizeram, por conta própria, na final do mundial contra o Santos. Quem sabe também, possamos ver jogadores estudarem disciplinadamente para um dia poder ganhar da melhor equipe do mundo, como o Chelsea fez contra o Barcelona.

O estudo do futebol não é uma bobagem, mas sim uma realidade, uma evolução. Não podemos ficar só no mesmo, pelo contrário, precisamos trazer coisas novas. A nova era do futebol e suas novidades não partem da moda Brasil como anos atrás. Acho que ainda não demos conta disso. Enquanto isso, vamos nos contentar em ver dirigentes precisando mandar carta de recomendação para jogadores dormirem mais cedo e em ver treinadores delegando diversas funções para o jogador suplente que vai entrar no segundo tempo, sendo que tudo que está sendo falado entra em um ouvido e sai pelo outro.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

História do 15 de Novembro F.C. Um Sonho, Uma Realidade


Já escrevi três das quatro postagens relacionadas às minhas aventuras esportivas no sudeste brasileiro. Primeiro, postei um texto sobre a TetraBrazil Soccer, empresa que me contratou para trabalhar nos EUA. Segundo, comentei sobre minha satisfatória conversa com o ídolo e ex-jogador do Tupi Futebol Clube de Juiz de Fora (MG), Moacyr Toledo, mais conhecido como Toledinho. Terceiro, escrevi sobre minha presença no treinamento do Tupi e da conversa com um torcedor fanático da equipe. Hoje, dia 14 de maio de 2012, escrevo de forma longa a última experiência esportiva antes do meu retorno para Brasília. 

Dois dias depois da minha chegada à casa dos meus avós em Juiz de Fora, meu avô Paulo perguntou se eu queria passar em Laranjal e conhecer o 15 de Novembro Futebol Clube. Primeiramente, como poucos sabem, Laranjal é uma pequena cidade de Minas Gerais, local onde meu avô e meu pai nasceram. Já o 15 de Novembro é o clube em que meu avô foi, além de fundador em 1950, atleta e treinador.

Desde pequeno ouvi as histórias sobre o 15 pela boca de meu avô. Sempre pareceu uma criança falando de seu brinquedo novo. Para muitos, era só uma passagem da vida do meu avô, mas para ele, era a própria vida representada pelas histórias do clube.

No primeiro momento, após a realização da pergunta, fiquei um pouco surpreso, não pelo fato de estranhar a pergunta, mas sim porque o dia da pergunta tinha chegado. Meu pai sempre falava que um dia ele me chamaria, já que a minha vida e o futebol estão totalmente ligados. Realmente, de todos da família, eu seria a única pessoa que meu avô convidaria para conhecer o 15 depois de tantos anos. Todas as vezes que eu visitava meus avós era em época de Natal, ou seja, não havia atividades no clube, portanto não adiantaria me convidar.

Depois da minha confirmação, meu avô logo foi ligar para o pessoal de Laranjal. A ideia era chamar os jogadores no dia 01 de maio, dia do trabalhador, para se apresentarem no campo, porque eu iria comandar um treino para eles. Naquele momento, fiquei muito alegre, ainda mais porque daria um treino no local onde meu avô mais se sentia em casa.

A viagem para laranjal seria um dia após minha chegada do Staff Training com a TetraBrazil em Rio das Flores (RJ). Quando cheguei do treinamento, minha avó, um pouco cabisbaixa, falou que os sócios do 15 não tinham conseguido reunir os jogadores para o feriado. Era de se esperar! Quem jogaria em pleno feriado?! Essa informação durou poucas horas quando o treinador da equipe ligou e avisou que nós poderíamos ir porque todos já estavam à espera.

Mesmo extremamente exausto do treinamento de 3 dias seguidos, fiquei logo desperto quando vi o rosto do meu avô repleto de ansiedade pelo dia seguinte. Não poderia decepcioná-lo. 

A viagem foi chuvosa a todo o momento. Já estávamos totalmente desanimados. A ocorrência do treinamento já era incerta. Minha avó até cantou a música para Santa Bárbara dar um jeitinho de acabar com a chuva na chegada de Laranjal.

A chegada ao campo estava marcada para as 15h. Logo depois que almocei na casa da irmã da minha avó, olhei para o céu e vi que as possibilidades tinham realmente acabado. Era um temporal muito forte. Deitei na cama e fui dormir. Às 14h45, meu avô bate na porta e me chama. Fiquei quieto por uns instantes imaginando o que ele queria fazer com aquela chuva, mas quem estava na chuva era para se molhar. Literalmente. Então coloquei minha roupa e chuteira e logo partimos para o campo.

Cheguei ao Estádio Serafim Naya e entrei na chamada “Cabana”, local onde teoricamente deveria ser utilizado para reuniões dos sócios, vestiário para os jogadores e festas para a comunidade. Na prática, a “Cabana” estava em precárias condições, mas com os pedreiros trabalhando seriamente no feriado do trabalhador para mudar aquela aparência. Dentre os trabalhadores ali presentes, estavam o Sacolé, treinador de todas as categorias do clube, e o goleiro de 18 anos. 

Quando cheguei, parecia que eu era uma estrela de cinema para o pessoal do clube que estava por lá, ainda mais porque meu avô falava para cada um que aparecia que eu era isso e aquilo dentro do futebol. Na verdade, eu era só mais um entusiasmado com o momento de estar ali, fazendo o que eu mais gosto, como todos os outros garotos.

Chegamos 15h em ponto e a chuva não cessava. O goleiro não parava de falar que queria treinar mesmo com um temporal. Passaram-se 2 horas e a chuva começou a amenizar. Não acreditei que até às 17h o meu avô conseguiu conversar com todos dentro da “Cabana” sobre um único assunto: o 15 de Novembro Futebol Clube.

Já estava pronto para voltar para casa naquele fim de tarde, um pouco triste, mas com a sensação de dever cumprido, quando chegaram mais três jogadores loucos para jogar bola. Estávamos já nos despedindo do pessoal quando os três falaram que o restante estava a caminho. Quando olhei para fora, já eram mais dez chegando. No total eram 14 jogadores. De forma nenhuma eu poderia ir embora sem fazer com que esses meninos voltassem para a casa sem ao menos tocar na bola. Assim sendo, fiz o que deveria fazer.

Foi naquele dia que eu vi como o futebol entrou na vida do meu avô de uma forma contagiante. Paulo Alvarenga Domingues, um dos poucos vivos desde o início da história do 15 se sentia como um presidente, mestre de obras, treinador, jogador e torcedor ao mesmo tempo. O clube para ele não merecia estar no local onde estava, com apenas 29 sócios pagando 15 reais por mês e sua estrutura desgastada. Se o clube acabasse, uma parte da vida do meu avô também acabaria. Já não bastasse a enchente que ocasionou sérios danos a cidade de Laranjal e que paralisou todas as atividades do 15 durante anos. Ele queria ver sempre mais. Até o livro “História do 15 de Novembro F.C. Um Sonho, Uma Realidade” meu avô escreveu em 2004 para conseguir auxílio da comunidade para reerguer a história do clube em 2010. 

Realizei um treinamento com todos durante 1h. Os jogadores não queriam parar, mas a noite já não deixava e os refletores também já não acendiam. Foi uma tarde incrível. Não imaginava tanto respeito pelos jogadores e tanta satisfação pelos sócios do clube. Foi um dia que será marcado pelo resto de minha vida. Tanto na minha quanto na do meu avô. Agora sim, eu posso falar: a história do 15 de Novembro F.C.  é um sonho, uma realidade!

Texto em homenagem ao meu avô Paulo Alvarenga Domingues.


“Quero com todos me desculpar
Pela omissão de nomes
De pessoas ou fatos,
Que deixei de relacionar

Escrever a história do 15
Difícil não foi não
Pois conheço o passado e o presente
O futuro, outros escreverão.

Finalizando, quero acrescentar:
Não se acomodem
É muito fácil criticar.
O difícil é construir e conversar”.

Versos do livro “História do 15 de Novembro F.C. Um Sonho, Uma Realidade”