domingo, 20 de maio de 2012

Chelsea campeão da Europa: mais uma confusão para a tendência do futebol mundial


Mais uma Champions League chegou ao fim neste sábado, dia 19 de maio de 2012, com a disputa entre Bayer de Munique e Chelsea. Todas as atenções do futebol se voltaram para essa partida. Duas equipes com perfis e composição tática completamente diferentes, mas com um único objetivo: ser o melhor time da Europa. Chelsea foi consagrado o campeão. 

Não posso negar minha tristeza em relação ao resultado final. Digo isso não por desgostar do Chelsea ou torcer pelo Bayer de Munique ou qualquer outro time que o clube inglês enfrentou. A lamentação da vitória é justificada pelo estilo de futebol apresentado pelo clube londrino que me preocupa, sobretudo por recapitular um pouco da tendência do futebol mundial iniciada em 1966 e que permaneceu até 1998. O futebol caracterizado pelo foco na defesa, robustez e composição física que buscou conhecimentos do treinamento esportivo das escolas soviéticas, britânicas e alemãs daquela época e que foge completamente da nova filosofia que está encantando os amantes do futebol em todo o mundo.

Os treinamentos voltados ao atletismo foram catda vez mais aplicados ao futebol e virou prioridade em detrimento à técnica a parir do momento em que o esporte observou a final entre Inglaterra e Alemanha Ocidental na Copa do Mundo de 1966. As duas seleções que cultivaram a ideia do treinamento físico das escolas europeias sobressaíram em relação às individualidades das seleções cotadas como campeãs, como o Brasil, que na época era a detentora da taça, Argentina e Portugal. 

A moda depois daquela final se tornou o futebol-defensivo, o futebol-físico, o futebol-pé-na-bola. O futebol-arte e o futebol-bola-no-pé não conseguia mais seu espaço, mesmo depois da vitória do Brasil em 1970 e da filosofia do “Futebol Total” empregada pelo holandês Rinus Michels em 1974 com o famoso “Carrossel Holandês”. A derrota da Holanda naquele ano para a Alemanha cravou mais uma vez o físico e a defesa em primeiro lugar, infelizmente. Foram anos e anos com o futebol voltado para esta filosofia. Até o Brasil adotou a nova tendência em 1994. O futebol estava diferente, menos técnico, mais físico, mais feio, mesmo assim a individualidade ainda fazia diferença no mundo, em um momento em que a Europa estava dando seus primeiros passos para o estudo do futebol aplicado ao jogo propriamente dito. 

Os anos de glória do futebol pé na bola se fixaram com soberania até a Copa de 1998, onde o mundo inteiro presenciou uma das Copas mais belas da história. As seleções encantavam mais uma vez com o futebol bonito e envolvente. Além das presenças de seleções que, tradicionalmente, apostavam no futebol técnico como a Holanda de Overmars, Kluivert e Bergkamp e a Argentina de Batistuta, Gallardo e Veron, os loucos por futebol tiveram o luxo de presenciar seleções nacionais mostrando uma cultura de futebol inovadora. Primeiro, o surgimento de um país africano que pela primeira vez empregou uma competitividade surpreendente em uma copa do mundo, a Nigéria, que liderou o grupo e deixou para trás a tradicional Espanha. Segundo, vieram os países europeus que se surpreenderam com um futebol mais técnico como a Romênia, Dinamarca, Noruega e a Croácia de Suker. Até países com um futebol tradicionalmente marcado pela defesa e aplicação física e tática dentro de jogo, obtiveram um futebol mais entusiástico como a Alemanha de Klinsmann e Bierhoff, campeã da Euro de 1996, a Inglaterra de Owen e Shearer e a Itália de Vieri e Baggio. Por último, o mundo presenciou uma final de duas equipes que ressurgiram o futebol arte durante a competição. O Brasil de Ronaldo, Rivaldo e Bebeto e a França de Zidane, Thuram e Djorkaeff que fizeram o mundo repensar em uma nova tendência de se jogar futebol.
 
Não se falava mais em futebol físico, defensivo e analítico. A Europa, após 1998, não queria mais focar nos circuitos físicos do treinamento esportivo, fisiologia do exercício e preparação física moderna. O futebol ganhou um olhar mais voltado para a técnica e para situações do jogo. O ideal de treinamento sistêmico ganhou mais espaço. Os países começaram a se interessar mais sobre as aplicações técnicas e táticas dentro do esporte ao invés do jogo físico e sem a posse de bola. As ideias do “Futebol Total” de Rinus Michaels que também foram ressurgidas por Johan Cruijff no Barcelona em 1990 começaram a ganhar força depois de 1998. Além dos resultados positivos do futebol-arte naquela época, o mundo futebolístico presenciava um momento cada vez mais mercadológico. As contratações astronômicas no Real Madrid e Barcelona trouxeram ao mundo do futebol um novo desejo: criar o time e a seleção dos sonhos.

Os países europeus tentaram se moldar à nova tendência, mas mudar uma cultura de se jogar futebol demanda um trabalho a longo prazo e alguns precisavam de mais provas para ver se aquilo valeria a pena. A prova saiu em 2002, com o Brasil campeão, mesmo com um time menos técnico que o de 1998. Entretanto, o que mais chamou a atenção foi a drástica mudança da vice-campeã mundial, a Alemanha. Na Ásia, a seleção europeia mostrou um futebol diferente do habitual presenciado por sua torcida. Apostou no jogo de posse de bola e foi aplaudida na chegada em casa mesmo com a derrota para o Brasil.

O futebol precisaria realmente mudar. A moda novamente tinha se tornado o Brasil. Um país que encantou o esporte pelas individualidades seria novamente o modelo do futebol mundial. Várias seleções tentaram inovar para 2006. A visão sempre era em cima do Brasil. Os jogadores brasileiros eram os mais procurados e valorizados em todo o mundo. O Brasil era realmente o país do futebol. Até quando ocorreu o desastre em 2006.

Nem os mais pessimistas esperavam o resultado desastroso da copa. O mundo viu a queda das equipes que tentaram empregar um futebol para frente, como foi o caso da Inglaterra, Holanda, Espanha, Argentina e, principalmente, o Brasil. Mesmo com a Alemanha com um futebol ainda mais técnico ficando em terceiro lugar, a final foi entre a França e a Itália. Duas equipes que não precisaram de um futebol envolvente para conquistar o mundo. O Brasil de Ronaldo, Adriano, Ronaldinho e Kaká não encantou e a Copa foi marcada por uma cabeçada e um zagueiro sendo o melhor do mundo.

Surgiram novamente as desconfianças. Voltaram-se os ideais de futebol-resultado ao invés de futebol-desempenho. As equipes da Europa mais uma vez apostaram no futebol-tradição, conforme a Itália apresentou em 2002. Até Brasil e Argentina se moldaram ao estilo de jogo defensivo para 2010.

Felizmente, na Copa de 2010, a tendência do jogo-pé-na-bola cai novamente diante das filosofias de jogo da Alemanha, Holanda e, principalmente da Espanha. Os resultados apresentados pela seleção espanhola na Euro 2008 e na Copa do Mundo em 2010 fizeram com que o mundo entrasse na era sistêmica e de estudo do futebol. Juntamente com o momento espanhol, o mundo atualmente convive com o fenômeno Barcelona e pelas respostas dadas por José Mourinho e Josep Guardiola. Os dois revolucionaram o treinamento do futebol com teorias e práticas efetivas. Hoje, o mundo futebolístico convive com a tendência do futebol estudado e tático. 

O Chelsea mostrou ontem, mesmo não seguindo os passos do “Futebol Total” ou do futebol técnico, que o mundo precisa cada vez mais ter um futebol tático por meio de muito estudo. Mais uma vez, volto a dizer que não me senti feliz ao ver o clube inglês ganhar, já que ele recapitulou uma forma de se jogar que não me agrada. Todavia, se enganam aqueles que acham que o futebol do Chelsea é o mesmo do futebol físico e defensivo da tendência mundial antiga. A disciplina tática mostrada ao mundo ontem é mais um reflexo da evolução do futebol mundial. Tenho certeza que a tendência que nasce depois de 2010 não mudou e ainda vai demorar para mudar. Talvez essa vitória do Chelsea seja mais um incentivo para o futebol-bola-no-pé encantar ainda mais. Justamente porque alguém descobriu um ponto fraco no meio de tantas qualidades.

Enquanto isso, o Brasil vai andando a passos lentos sem uma filosofia e cultura de jogo. As individualidades estão acabando e as outras nações já se deram conta que o país não é um modelo e muito menos criará um. Sem estudo e implementação sistêmica do jogo, o Brasil não vai conseguir tão cedo ser o país do futebol novamente. Ainda bem que antes de surgir as escolas europeias de treinamento esportivo, nasceram Garrincha e Pelé. Ainda bem que antes de surgir os estudos e aplicações do futebol sistêmico, nasceram Romário e Ronaldo. Quem nascerá agora para ganhar de um futebol tão evoluído como o da Europa atualmente, já que o Brasil não consegue acompanhar seus passos? Kaká, Ronaldinho e Robinho não aguentaram essa injusta pressão. Coitado do Neymar...

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