Mais uma Champions League chegou
ao fim neste sábado, dia 19 de maio de 2012, com a disputa entre Bayer de
Munique e Chelsea. Todas as atenções do futebol se voltaram para essa
partida. Duas equipes com perfis e composição tática completamente diferentes,
mas com um único objetivo: ser o melhor time da Europa. Chelsea foi consagrado
o campeão.
Não posso negar minha tristeza
em relação ao resultado final. Digo isso não por desgostar do Chelsea ou torcer
pelo Bayer de Munique ou qualquer outro time que o clube inglês enfrentou. A
lamentação da vitória é justificada pelo estilo de futebol apresentado pelo
clube londrino que me preocupa, sobretudo por recapitular um pouco da tendência
do futebol mundial iniciada em 1966 e que permaneceu até 1998. O futebol
caracterizado pelo foco na defesa, robustez e composição física que buscou
conhecimentos do treinamento esportivo das escolas soviéticas, britânicas e
alemãs daquela época e que foge completamente da nova filosofia que está
encantando os amantes do futebol em todo o mundo.
Os treinamentos voltados ao
atletismo foram catda vez mais aplicados ao futebol e virou prioridade em
detrimento à técnica a parir do momento em que o esporte observou a final entre
Inglaterra e Alemanha Ocidental na Copa do Mundo de 1966. As duas seleções que
cultivaram a ideia do treinamento físico das escolas europeias sobressaíram em relação
às individualidades das seleções cotadas como campeãs, como o Brasil, que na
época era a detentora da taça, Argentina e Portugal.
A moda depois daquela final se
tornou o futebol-defensivo, o futebol-físico, o futebol-pé-na-bola. O futebol-arte
e o futebol-bola-no-pé não conseguia mais seu espaço, mesmo depois da vitória
do Brasil em 1970 e da filosofia do “Futebol Total” empregada pelo holandês
Rinus Michels em 1974 com o famoso “Carrossel Holandês”. A derrota da Holanda
naquele ano para a Alemanha cravou mais uma vez o físico e a defesa em primeiro
lugar, infelizmente. Foram anos e anos com o futebol voltado para esta
filosofia. Até o Brasil adotou a nova tendência em 1994. O futebol estava
diferente, menos técnico, mais físico, mais feio, mesmo assim a individualidade
ainda fazia diferença no mundo, em um momento em que a Europa estava dando seus
primeiros passos para o estudo do futebol aplicado ao jogo propriamente dito.
Os anos de glória do futebol pé
na bola se fixaram com soberania até a Copa de 1998, onde o mundo inteiro
presenciou uma das Copas mais belas da história. As seleções encantavam mais
uma vez com o futebol bonito e envolvente. Além das presenças de seleções que,
tradicionalmente, apostavam no futebol técnico como a Holanda de Overmars,
Kluivert e Bergkamp e a Argentina de Batistuta, Gallardo e Veron, os loucos por
futebol tiveram o luxo de presenciar seleções nacionais mostrando uma cultura
de futebol inovadora. Primeiro, o surgimento de um país africano que pela
primeira vez empregou uma competitividade surpreendente em uma copa do mundo, a
Nigéria, que liderou o grupo e deixou para trás a tradicional Espanha. Segundo,
vieram os países europeus que se surpreenderam com um futebol mais técnico como
a Romênia, Dinamarca, Noruega e a Croácia de Suker. Até países com um futebol
tradicionalmente marcado pela defesa e aplicação física e tática dentro de
jogo, obtiveram um futebol mais entusiástico como a Alemanha de Klinsmann e
Bierhoff, campeã da Euro de 1996, a Inglaterra de Owen e Shearer e a Itália de
Vieri e Baggio. Por último, o mundo presenciou uma final de duas equipes que
ressurgiram o futebol arte durante a competição. O Brasil de Ronaldo, Rivaldo e
Bebeto e a França de Zidane, Thuram e Djorkaeff que fizeram o mundo repensar em
uma nova tendência de se jogar futebol.
Não se falava mais em futebol
físico, defensivo e analítico. A Europa, após 1998, não queria mais focar nos
circuitos físicos do treinamento esportivo, fisiologia do exercício e
preparação física moderna. O futebol ganhou um olhar mais voltado para a
técnica e para situações do jogo. O ideal de treinamento sistêmico ganhou mais
espaço. Os países começaram a se interessar mais sobre as aplicações técnicas e
táticas dentro do esporte ao invés do jogo físico e sem a posse de bola. As
ideias do “Futebol Total” de Rinus Michaels que também foram ressurgidas por
Johan Cruijff no Barcelona em 1990 começaram a ganhar força depois de 1998.
Além dos resultados positivos do futebol-arte naquela época, o mundo
futebolístico presenciava um momento cada vez mais mercadológico. As
contratações astronômicas no Real Madrid e Barcelona trouxeram ao mundo do
futebol um novo desejo: criar o time e a seleção dos sonhos.
Os países europeus tentaram se
moldar à nova tendência, mas mudar uma cultura de se jogar futebol demanda um
trabalho a longo prazo e alguns precisavam de mais provas para ver se aquilo valeria
a pena. A prova saiu em 2002, com o Brasil campeão, mesmo com um time menos
técnico que o de 1998. Entretanto, o que mais chamou a atenção foi a drástica
mudança da vice-campeã mundial, a Alemanha. Na Ásia, a seleção europeia mostrou
um futebol diferente do habitual presenciado por sua torcida. Apostou no jogo
de posse de bola e foi aplaudida na chegada em casa mesmo com a derrota para o
Brasil.
O futebol precisaria realmente
mudar. A moda novamente tinha se tornado o Brasil. Um país que encantou o
esporte pelas individualidades seria novamente o modelo do futebol mundial. Várias
seleções tentaram inovar para 2006. A visão sempre era em cima do Brasil. Os
jogadores brasileiros eram os mais procurados e valorizados em todo o mundo. O
Brasil era realmente o país do futebol. Até quando ocorreu o desastre em 2006.
Nem os mais pessimistas
esperavam o resultado desastroso da copa. O mundo viu a queda das equipes que
tentaram empregar um futebol para frente, como foi o caso da Inglaterra, Holanda,
Espanha, Argentina e, principalmente, o Brasil. Mesmo com a Alemanha com um
futebol ainda mais técnico ficando em terceiro lugar, a final foi entre a
França e a Itália. Duas equipes que não precisaram de um futebol envolvente
para conquistar o mundo. O Brasil de Ronaldo, Adriano, Ronaldinho e Kaká não
encantou e a Copa foi marcada por uma cabeçada e um zagueiro sendo o melhor do
mundo.
Surgiram novamente as
desconfianças. Voltaram-se os ideais de futebol-resultado ao invés de futebol-desempenho.
As equipes da Europa mais uma vez apostaram no futebol-tradição, conforme a
Itália apresentou em 2002. Até Brasil e Argentina se moldaram ao estilo de jogo
defensivo para 2010.
Felizmente, na Copa de 2010, a
tendência do jogo-pé-na-bola cai novamente diante das filosofias de jogo da
Alemanha, Holanda e, principalmente da Espanha. Os resultados apresentados pela
seleção espanhola na Euro 2008 e na Copa do Mundo em 2010 fizeram com que o
mundo entrasse na era sistêmica e de estudo do futebol. Juntamente com o
momento espanhol, o mundo atualmente convive com o fenômeno Barcelona e pelas
respostas dadas por José Mourinho e Josep Guardiola. Os dois revolucionaram o
treinamento do futebol com teorias e práticas efetivas. Hoje, o mundo
futebolístico convive com a tendência do futebol estudado e tático.
O Chelsea mostrou ontem, mesmo
não seguindo os passos do “Futebol Total” ou do futebol técnico, que o mundo
precisa cada vez mais ter um futebol tático por meio de muito estudo. Mais uma
vez, volto a dizer que não me senti feliz ao ver o clube inglês ganhar, já que
ele recapitulou uma forma de se jogar que não me agrada. Todavia, se enganam aqueles
que acham que o futebol do Chelsea é o mesmo do futebol físico e defensivo da
tendência mundial antiga. A disciplina tática mostrada ao mundo ontem é mais um
reflexo da evolução do futebol mundial. Tenho certeza que a tendência que nasce
depois de 2010 não mudou e ainda vai demorar para mudar. Talvez essa vitória do
Chelsea seja mais um incentivo para o futebol-bola-no-pé encantar ainda mais.
Justamente porque alguém descobriu um ponto fraco no meio de tantas qualidades.
Enquanto isso, o Brasil vai
andando a passos lentos sem uma filosofia e cultura de jogo. As
individualidades estão acabando e as outras nações já se deram conta que o país
não é um modelo e muito menos criará um. Sem estudo e implementação sistêmica
do jogo, o Brasil não vai conseguir tão cedo ser o país do futebol novamente.
Ainda bem que antes de surgir as escolas europeias de treinamento esportivo,
nasceram Garrincha e Pelé. Ainda bem que antes de surgir os estudos e
aplicações do futebol sistêmico, nasceram Romário e Ronaldo. Quem nascerá agora
para ganhar de um futebol tão evoluído como o da Europa atualmente, já que o
Brasil não consegue acompanhar seus passos? Kaká, Ronaldinho e Robinho não
aguentaram essa injusta pressão. Coitado do Neymar...
Muito bom!
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