quarta-feira, 16 de maio de 2012

A volta dos que já foram: Análise crítica do conceito de preleção no futebol brasileiro e europeu


Atualmente, o futebol brasileiro se encontra em um momento muito diferente do que era decorrente há 6, 7 e 8 anos atrás. Os clubes do futebol nacional, a cada ano que passa, conseguem “repatriar” um enorme número de jogadores que fizeram e ainda têm condições de fazer sucesso nos clubes da Europa e com a camisa de seleções nacionais. Ronaldinho Gaúcho, Deco, Fred, Elano, Liedson, Renato, Juninho, Vagner Love, Gilberto Silva e Adriano são alguns nomes dessa vasta lista. Os motivos para o retorno são os mais diversos. 

Muitos especialistas associam o “repatriamento” à recente crise econômica que a Europa enfrentou e que alguns países ainda enfrentam. Isso pode mostrar a volta de vários jogadores ainda jovens, mas que não foram efetivos em relação custo-benefício na avaliação dos clubes europeus. Os dirigentes dos clubes brasileiros enfatizam a evolução da gestão e do poder mercadológico do futebol brasileiro para realização de contratações consideradas, anos atrás, como impossíveis. Já os jogadores, levam os motivos mais para o lado pessoal, alegando falta de adaptação com o ambiente fora do país ou do estado onde sempre viveram. Muitos ainda voltam falando do amor pela camisa do clube de coração.

Motivos à parte, a ideia deste texto não é falar o que realmente acarreta a volta desses jogadores ou coisa parecida, mas sim, analisar como que esses jogadores estão voltando e desta forma chegar ao tema da postagem de hoje: a preleção.

Independentemente das opiniões diversas sobre o desempenho desses jogadores, é inevitável afirmar que a volta da maioria deles é marcada por um perfil cada vez mais de liderança tanto dentro do ambiente do clube, quanto dentro de campo. Os jogadores que fazem parte da tal lista são os mais procurados pela imprensa, costumam ser os capitães das equipes em que jogam, são os mais cobrados dentro de campo e ainda conseguem encantar nas partidas. 

São várias as perguntas que aparecem acerca dessa reflexão: As revelações já não conseguem mais suprir as necessidades do alto nível em que o futebol nacional se encontra? Os treinamentos dos times europeus são bem melhores do que os nossos?  As categorias de base não conseguem mais revelar jogadores como antes? Os clubes brasileiros preferem apostar em jogadores que possam dar resultado em curto prazo do que investir em projetos de categorias de base em longo prazo? São apenas coincidências na maneira de jogar dos jogadores? Ou é só um momento do futebol brasileiro e isso é passageiro?

A minha ideia não é responder nenhuma das questões acima, ainda mais porque são perguntas rotineiramente comentadas no mundo futebolístico. Acreditando que nunca um momento dentro do futebol se justifica por uma única razão, vou analisar a relação da preleção como fator diferencial entre o futebol brasileiro e o futebol europeu.

Certo dia, no intervalo do treinamento que realizei para trabalhar nos Estados Unidos como treinador, eu estava conversando com dois treinadores que são meus amigos sobre diversos assuntos do futebol, já que os dois também são apaixonados pelo esporte. O assunto “Neymar” surgiu no ambiente. Não sei se fui eu, o Vitor Neves ou o Paulo Sivieri que fez a pergunta, mas sei que o questionamento era o seguinte: “o Neymar deve sair ou não do Brasil antes da Copa”? A minha resposta foi sim, já que lá fora ele iria estudar muito mais sobre o futebol. Na verdade, a resposta poderia até ser: “Sim, porque lá fora ele iria ter verdadeiras preleções”. 

A preleção é um termo muito utilizado no futebol e faz parte do dia-a-dia de praticamente todas as equipes. De acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra preleção significa: “palestra com finalidade didática ou educativa; aula, lição”. A palavra prelecionar significa: “fazer preleções; dar preleção ou lição; lecionar; ensinar; discursar em público”. 

O que todas essas definições nos mostram? Significa que a preleção é um ambiente de aprendizado onde são observadas lições, aulas, ensinamentos e onde é respeitado um espaço para discussões. No futebol não pode ser diferente. A preleção não pode ser confundida com palestra de motivação antes do jogo. Não que eu seja contra isso, muito pelo contrário, mas a preleção é muito mais que estímulos minutos antes do jogo. Não se pode pensar em preleção apenas no dia do jogo. Os ensinamentos devem ser dados diariamente nos treinamentos. O grande problema é que os clubes de futebol brasileiro ainda não conseguem utilizar meios didáticos para fazer com que os jogadores entendam mais sobre o futebol e suas dimensões dentro do campo.

Visivelmente, podemos observar a diferença na leitura e entendimento de jogo dos jogadores que foram para a Europa e voltaram para jogar em clubes brasileiros. É comum observarmos jogadores como o Renato, Deco, Elano e Juninho jogarem como meias armadores, mesmo não sendo suas posições de origem. A inteligência dentro de campo desses jogadores supera a capacidade física dos demais jogadores do futebol nacional. Peço licença para escrever uma frase que meu amigo Paulo Sivieri sempre fala: “Até o Sergio Busquets do Barcelona seria camisa 10 no Brasil”. Será que eu estou sendo muito sonhador mais uma vez? O futebol brasileiro ainda deve continuar com treinamentos diários dentro de campo, visando principalmente a parte física? É errado tirar os jogadores do campo de jogo e levar para uma sala de vídeo e mostrar situações táticas dos adversários? Como se constrói uma filosofia de jogo só pela prática? 

Para finalizar, acredito que o futebol mundial segue tendências. Realmente, o Brasil ainda não entrou na tendência dos grandes times europeus em ensinar o futebol para os jogadores. Talvez um dia, possamos ver jogadores brasileiros saindo no dia de folga da concentração para ver o seu futuro adversário jogar, como os principais jogadores do Barcelona fizeram, por conta própria, na final do mundial contra o Santos. Quem sabe também, possamos ver jogadores estudarem disciplinadamente para um dia poder ganhar da melhor equipe do mundo, como o Chelsea fez contra o Barcelona.

O estudo do futebol não é uma bobagem, mas sim uma realidade, uma evolução. Não podemos ficar só no mesmo, pelo contrário, precisamos trazer coisas novas. A nova era do futebol e suas novidades não partem da moda Brasil como anos atrás. Acho que ainda não demos conta disso. Enquanto isso, vamos nos contentar em ver dirigentes precisando mandar carta de recomendação para jogadores dormirem mais cedo e em ver treinadores delegando diversas funções para o jogador suplente que vai entrar no segundo tempo, sendo que tudo que está sendo falado entra em um ouvido e sai pelo outro.

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